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RESENHA | Meu Amigo Kim Jong-un por Keum Suk Gendry-Kim

(Capa: Guilherme Barata e Bruno Zago)

MEU AMIGO KIM JONG-UN

Tema: Guerra da Coreia, Nacionalidade, Identidade

Meu Amigo Kim Jong-Un é uma graphic novel que, ao lado de Grama e A Espera, finaliza a trilogia da premiada quadrinista Keum Suk Gendry Kim sobre os efeitos das guerras na Coreia.

O livro foi publicado no Brasil em 2024 pela Editora Pipoca & Nanquim e com tradução da Profª. Drª. Yun Jung Im Park da Universidade de São Paulo (USP).

"Na época em que Kim Jong-un nasceu, eu vivenciava uma grande mudança na minha vida." (p.30)

Mais de setenta anos se passaram desde a Guerra da Coreia (1950–1953), o conflito que dividiu a península em duas nações: Coreia do Norte e Coreia do Sul. Famílias foram separadas, mais de 2 milhões de civis perderam a vida, e muitos outros sofreram sequestros, torturas e execuções.

Apesar do Armistício de Panmunjom, assinado em 1953, que encerrou oficialmente os combates, a guerra nunca chegou ao fim de fato. Até hoje, ela persiste através de provocações, tensões diplomáticas e confrontos esporádicos. As cicatrizes desse período ainda permanecem na memória de quem o viveu e funcionam como um lembrete para as novas gerações sobre as consequências de uma guerra que nunca terminou de verdade.

É nesse contexto que entra a obra de Keum Suk Gendry-Kim. Mais do que falar sobre as sequelas da guerra ou a divisão territorial da península, a autora propõe uma leitura mais humana e contextualizada de Kim Jong-un, se distanciando da imagem caricata e sensacionalista frequentemente veiculada pela mídia. Ela busca compreender como certos eventos e circunstâncias contribuíram para moldar a figura do ditador que conhecemos hoje.

Morando na ilha de Ganghwa, próxima à fronteira com a Coreia do Norte, Gendry-Kim escuta com frequência os ecos dos exercícios militares, como os testes de bombas que lembram diariamente a tensão latente entre os dois países. Essa vivência próxima à tensão do conflito dá ainda mais peso ao seu trabalho.

A partir de um olhar jornalístico, a autora mistura entrevistas, relatos e reflexões pessoais. Para construir a narrativa, ela conversou com pessoas que conviveram com Kim Jong-un na infância, com desertores do regime norte-coreano e, até mesmo, com o ex-presidente sul-coreano Moon Jae-in.

Quando nos demos as mãos pela primeira vez, Kim Jong-Un disse: "Uma distância tão pequena até aqui, mas levamos tantas décadas." (p.192)
Líderes da Coreia do Sul, Moon Jae-in (D) e da Coreia do Norte, Kim Jong-un, apertam as mãos na divisa entre os dois países, na Zona Desmilitarizada da vila de Panmunjom, em 27 de abril de 2018.
Líderes da Coreia do Sul, Moon Jae-in (D) e da Coreia do Norte, Kim Jong-un (E), apertam as mãos na divisa entre os dois países, na Zona Desmilitarizada da vila de Panmunjom, em 27 de abril de 2018.
 Foto: Reuters

O gesto de Kim cruzando a linha de demarcação militar, de mãos dadas com Moon, comoveu o mundo inteiro e foi visto como um possível ponto de virada rumo à paz. No entanto, essa esperança se enfraqueceu rapidamente com a retomada do programa nuclear norte-coreano e o aumento das tensões com os Estados Unidos, aliados da Coreia do Sul.

Nesta obra, a autora se dedica a contar histórias reais de pessoas comuns para pessoas comuns. Em um dos relatos, somos levados a refletir sobre a imagem distorcida que muitas vezes temos dos norte-coreanos, como se fossem figuras passivas, totalmente alinhadas ao regime. A obra nos lembra que o que pode ser considerado "certo" ou "bom" em um contexto, pode não fazer sentido em outro e vice-versa.

Em vez de oferecer respostas prontas, a autora nos mostra a complexidade por trás de cada história, revelando o medo, a insegurança e as contradições que envolvem o desejo de reunificação; um desejo que continua esbarrando em interesses políticos, disputas ideológicas e uma realidade onde o diálogo nem sempre é possível.

Cada livro da trilogia aborda um tema diferente, mas todos partem de uma mesma origem: as feridas deixadas pela guerra e pela separação. Longe de só apresentar os fatos, nas palavras da própria autora, "este livro carrega uma mensagem de urgência pela paz".

A autora

Foto: Reprodução

Keum Suk Gendry-Kim nasceu em 1971, na região de Jeolla, no sul da Coreia do Sul. Ela estudou pintura na Universidade de Sejong e na École Supérieure Des Arts Décoratifs, em Estrasburgo, França. Atualmente, ela vive com o marido francês na ilha de Ganghwa, próxima à fronteira com a Coreia do Norte. Seu livro "Meu Amigo Kim Jong-un" encerra a trilogia junto às obras 'Grama' e 'A Espera'. A autora recebeu reconhecimento mundial após o lançamento de 'Grama', que lhe rendeu o prêmio Harvey em 2020. Suas obras abordam de forma delicada e realista temas complexos da história e sociedade sul-coreana.

Referências Bibliográficas

GENDRY-KIM, K.S. Meu Amigo Kim Jong-un. 1. ed. Tradução Yun Jung Im Park. São Paulo: Editora Pipoca e Nanquim, 2024.

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